Finados: A pandemia e a morte, segundo moradores de periferias adeptos de diferentes religiões

Reportagem de Laís Diogo. Edição de texto: Thiago Borges.

Foto em destaque: Marcelo Camargo / Agência Brasil

“Ele enxugará dos vossos olhos toda lágrima. Não haverá mais morte, nem tristeza, nem choro, nem dor, pois a antiga ordem já passou”.

A evangélica Vanessa Santos Barbosa, de 23 anos, resume seu entendimento sobre a morte citando a passagem bíblica acima, retirada do livro do Apocalipe. Moradora do Jardim Apurá, na região de Pedreira (zona Sul de São Paulo), ela acredita que após a morte a alma fica adormecida à espera do arrebatamento que acontecerá com a volta de Cristo.

Vanessa (Foto: Arquivo pessoal)

“Diante dessa pandemia, podemos sentir que o Consolador está ali ao nosso lado, intercedendo por nós, nos ajudando a enfrentar nossas lutas, dentro dos nossos momentos de ‘crise’”, observa Vanessa, que é cristã desde os 4 anos de idade e, atualmente, é diaconisa na igreja evangélica Família Ebenézer.

A Periferia em Movimento entrevistou Vanessa e outros moradores de periferias de diferentes religiões (cristã, espírita e de matriz africana) para saber como enxergam a morte – em especial porque este dia de finados (02/11) é marcado pela pandemia de coronavírus, que deixa mais de 160 mil pessoas vítimas fatais no Brasil.

A data faz a autônoma Isabela Mota dos Santos se recordar das idas ao cemitério com a avó. “Ela sempre me dizia para ir lavar os túmulos, deixar limpinha as fotos, colocar flor, porque quando o túmulo é sem flor é porque os familiares esqueceram aquela pessoa”, conta ela, que mora na Vila Luzita (em Santo André).

Ainda que a morte de um ente querido gere um sentimento de perda para quem fica, Isabela ressalta que é um momento de transformação.

“Aqueles que foram, eu tenho certeza que não foram à toa. Foram escolhidos para estar num lugar melhor e ajudar na outra dimensão. E temos que nos preparar por que a gente tem aqui em terra um longo caminho a percorrer, mas esse caminho não vais ser fácil”, diz ela, que é umbandista com fundamento no candomblé.

Ana Luísa (Foto: Arquivo pessoal)

Também umbandista, Ana Luísa Reis indica o que é chamado de “desencarne coletivo”, quando milhares ou milhões de pessoas morrem ao mesmo tempo. Por isso, a situação é espiritualmente complexa, mas não desamparada.

“Há uma grande movimentação. Os seus guias, os seus mentores, aqueles que te protegem estão preparados para que esse momento aconteça, para receber seu espírito”, diz a jovem de 25 anos, que mora no Jardim Iporanga, região do Grajaú (Extremo Sul de São Paulo).

A hora é de aprendizado, diz o artista plástico Douglas Macedo, de 23 anos. “Devemos aprender algo com esse momento, mas o quê? Isso depende do relacionamento íntimo de cada um”, nota ele.

Morador da Vila Nova Cachoeirinha, na zona Norte de São Paulo, Douglas frequenta uma casa de umbanda que tem feito de 3 a 4 giras por mês, separando os frequentadores para evitar aglomeração e “para que, ainda em tempos de crise, possamos continuar evoluindo nossa mediunidade e espiritualidade”. 

A estudiosa espírita Monique Papachristodoulou, da Vila Maria, diz que a morte é apenas uma passagem. “Precisamos lembrar que todos são amparados na espiritualidade por espíritos amigos e familiares, não ficando sem assistência”, explica ela, que é trabalhadora no Centro Nosso Lar Casas André Luiz há 10 anos. 

“Apesar de sabermos que muitas pessoas não estão tendo a condição de se despedir de seus entes queridos, o espiritismo nos dá essa tranquilidade: essa separação é passageira e nos encontraremos em uma nova existência”, completa.

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