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De “Netflix” periférica a jogo no mangue: Representatividade na tecnologia – Periferia em Movimento

De “Netflix” periférica a jogo no mangue: Representatividade na tecnologia

Por Thiago Borges. Imagem de capa: reprodução Mangrove

Entre São Paulo a Recife, coletivos e negócios tocados por moradores de periferias questionam e experimentam como aliar as tecnologias digitais às lutas por direito do cotidiano. É possível? André Luiz Pereira bota fé que sim e já tá fazendo.

O morador de 34 anos do Jardim Ângela, Extremo Sul da capital paulista, é um dos responsáveis pela criação de uma “Netflix” da quebrada: a Videoteca Popular, uma plataforma de streaming como a gigante estadunidense que, em vez de exibir produções de Hollywood, pretende veicular filmes populares e produzidos nas periferias. “A Videoteca é um espaço de troca e união dessa galera que produz e consome esses filmes”, diz André. 

André, da Videoteca Popular: garimpagem de filmes para exibição (foto: Divulgação)

A ideia não é necessariamente nova. A Videoteca Popular é fruto do coletivo Núcleo de Comunicação Alternativa (NCA), que em 2005 criou uma “vídeo locadora”, com empréstimo gratuito de filmes em parceria com organizações da região, como Sacolão das Artes, Fundação Julita e Cedeca Interlagos.

Com a ampliação do acesso à internet e o surgimento de plataformas comerciais, em 2018 o grupo avaliou que seria interessante migrar para um espaço digital. “Potencializamos a criação de um público consumidor para essas produções, além de permitir que diferentes parcerias sejam possíveis”, aponta André.

Hoje, a Videoteca Popular exibe os filmes via youtube, zoom, streamyard e outros meios existentes, sempre seguidos de debates com participação dos produtores e do público. Enquanto isso, o grupo desenvolve a própria plataforma com apoio do VAI TEC, um programa da Prefeitura de São Paulo. “Tivemos alguns problemas durante a implantação, mas nosso foco se manteve, que é dar vazão para as produções realizadas na periferia e para a periferia”, continua André.

Ele compartilhou esses problemas e os aprendizados da jornada durante um ciclo de encontros on-line com objetivo de promover trocas entre 12 empreendedores de periferias de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Pernambuco. Realizado entre fevereiro e março pelas organizações A Banca, do Jardim Ângela (Zona Sul de São Paulo), e Instituto Procomum (da Baixada Santista), o projeto tem apoio do Programa DICE (Developing Inclusive and Creative Economies) do British Council. Saiba mais aqui. 

O ciclo envolveu outras iniciativas que apostam na tecnologia digital. É o caso da Cordel, uma startup que oferece soluções educativas para o cenário digital com a linguagem nordestina. A ideia surgiu em 2019, com estudantes do ensino médio, entre eles Vinnicius Rodrigo Ferreira Nazaré. Os adolescentes começaram fazendo jogos baseados nos objetivos de desenvolvimento sustentável. 

“A partir disso é que vimos uma possibilidade de empreender de alguma forma”, observa Vinnicius, que tem 18 anos e mora no bairro do Pina, em Recife. 

Cordel: iniciativa quer usar tecnologia na educação (foto: Divulgação)

O grupo viu um edital para participar de um programa de aceleração em economia criativa do Porto Digital, um parque tecnológico que reúne mais de 300 empresas da área na capital pernambucana. Inicialmente, a Cordel queria desenvolver ferramentas transmídia, adaptando livros para a linguagem de jogos. Dessa forma, surgiu o Pequeno Cabra da Peste, inspirado no clássico Pequeno Príncipe. 

As trocas com outros profissionais e a atuação junto a moradores da favela do Pilar, ao lado do polo tecnológico, ajudaram a pensar o modelo de negócios. “Atualmente, a gente quer desenvolver tecnologias para serem utilizadas por educadores como ferramentas pedagógicas dentro da sala de aula e aumentar o engajamento dos alunos”, explica Vinnicius, que hoje atua em um grupo de 8 pessoas junto a professores e já pensa em processos de licitação pública.

E o contato com pessoas de outras áreas de atuação e em outras regiões do País contribui para o aperfeiçoamento.

Mangrove desenvolve jogos com representatividade (foto: reprodução)

Rafael Silva, de 30 anos, chegou aos encontros on-line com o desafio de aumentar a dedicação de tempo da equipe. “O maior gargalo para nossa empresa é o fato de que apenas eu estou 100% no negócio”, explica ele, que é o único dos 5 funcionários que atua somente na Mangrove, enquanto o negócio não gera renda suficiente para manter toda a equipe em período integral. “Por conta disto a qualidade e os prazos são comprometidos e isto nos deixa menos competitivos no mercado”, continua o morador do bairro de Brasília Teimosa, também em Recife.

Criada em 2019, a Mangrove Game Studio é uma startup que tem o objetivo de enaltecer e difundir a música, os costumes e saberes de periféricos nordestinos, longe dos estereótipos. 

Hoje, o grupo já tem 3 jogos: o Mangue & Beach para computador (clique aqui para jogar); o Mangueboy 2D para celulares Android ou Apple (clique aqui); e o Manguebou Mud Life 3D, em desenvolvimento. “Acreditamos nos jogos como uma poderosa ferramenta de transformação, diversão, além de uma mídia atual eficaz na luta contra preconceitos e desigualdades”, finaliza Rafael.

Essa é a terceira e última de uma série de reportagens da Periferia em Movimento sobre os encontros realizados por A Banca e Instituto Procomum, com o apoio do Programa DICE (Developing Inclusive and Creative Economies) do British Council.

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