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Treta na facu: estudantes periféricos enfrentam universidades privadas no final de semestre – Periferia em Movimento

Treta na facu: estudantes periféricos enfrentam universidades privadas no final de semestre

Reportagem de Laís Diogo. Edição de texto de Thiago Borges

E o final de semestre na facu, tá como? Para estudantes periféricos de universidades privadas de São Paulo, tá difícil – e não é por causa das provas. As instituições estão aplicando um outro tipo de “teste”: de paciência e adivinhação.

Além das incertezas ocasionadas pela pandemia de coronavírus, que interrompeu aulas presenciais e forçou a adaptação apressada ao ensino à distância, alunos ainda têm de lidar com alta das mensalidades, lives motivacionais e a demissão de professores – como aconteceu no início da semana com mais de 300 docentes da Universidade Nove de Julho (Uninove), em São Paulo, por meio de mensagem no acesso à plataforma digital.

Instituições como Universidade Santo Amaro (Unisa), Universidade São Judas Tadeu (USJT), Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU), Universidade Anhembi Morumbi e Faculdade Paulus de Comunicação (Fapcom) também fizeram cortes de funcionários.

A Periferia em Movimento conversou com alguns estudantes para saber como têm vivido essa situação. Confira abaixo.

Aumento da mensalidade no meio da quarentena

Edilson Cruz da Silva (foto: arquivo pessoal)

Estudante do quarto semestre de Serviço Social na Unisa, Edilson Cruz da Silva, de 33 anos, ficou assustado com a notícia da mudança para as aulas na web. “Foi algo necessário e uma alternativa para mitigar os efeitos da pandemia no período letivo”, avalia ele, que mora no Jardim Herculano (zona Sul de São Paulo).

“Percebi, neste período tão conturbado, um grande esforço por parte dos professores e professoras para propiciar uma boa experiência de estudos”.

O mesmo não se pode dizer da instituição: “Ouvi reclamações dos alunos quanto à dificuldade de comunicação, praticamente apenas pelo ‘fale conosco’, ocasionando em problemas para resolver as burocracias”.

Mais do que isso, a Unisa aumentou o valor das mensalidades em meio à crise ocasionada pela pandemia. O curso de Edilson teve alta de quase 20%, mas o reajuste foi revogado nessa semana. Para ele, a instituição quer se “reinventar” para gerar mais lucro.

“Eles acabam voltando atrás ao perceberem que nós, alunos, reivindicamos as devidas correções. Isto é um agravamento em se tratando de um momento tão difícil para todos nós, onde muitos alunos e familiares não têm ao menos a garantia de emprego, mostrando claramente a falta de empatia e respeito da Unisa com os alunos, aqui vistos apenas como clientes”.

Sem cabeça para as provas finais

Tatiane Martins (foto: arquivo pessoal)

Estudante do quinto semestre de Ciências Biológicas na Unisa, Tatiane Martins, de 28 anos, estava se adaptando às aulas virtuais de um curso que exige rotina em laboratório. Tudo ocorria bem, dentro do possível, até o dia 15 de junho.

“Tomamos um susto ao abrir o ‘portal do aluno’ e dar de cara com uma mensalidade absurda, atualizada para a rematrícula do próximo semestre”, diz ela, que mora no Grajaú (Extremo Sul de São Paulo) e é bolsista na faculdade. No mesmo dia, ela entrou em contato com colegas de sala e de outras áreas que também têm bolsas que valem até o final do curso, e que comentaram a mesma situação.

No dia seguinte (16/06), mais uma novidade: “alguns professores do nosso curso e inclusive o coordenador tinham sido demitidos por telegrama”, comenta Tatiane.

A sequência de acontecimentos em plena semana de provas finais terminaria com um ato em frente ao campus 1 da universidade no dia 19, mas na véspera a Unisa se manifestou sobre as mensalidades dizendo que voltaria atrás na decisão.

“Deixo minha grande indignação pela perda de nossos professores de anos de universidade e que são essenciais na continuidade de nossa formação, além de que os professores ainda ativos estão exaustos de tantas demandas e medo de também serem demitidos”, salienta Tatiane.

“O grande problema das faculdades privadas é achar que o aluno está ali apenas para adquirir diploma, sem pensar que muitos ou a maioria trabalham em 2 empregos para conseguir estudar e ainda lidar com as demandas da vida cotidiana. Educação não é mercadoria”.

Os melhores professores na rua

Loyann Goes (foto: arquivo pessoal)

Com acesso “horrível” à internet, Loyann Goes Dinis sofre para conseguir assistir às aulas on-line. A estudante de 21 anos mora no Parque Grajaú (Extremo Sul de São Paulo) e está no sétimo semestre de Publicidade e Propaganda na Universidade Nove de Julho (Uninove).

“Diversas vezes, em momentos importantes de explicações, não consegui acompanhar o conteúdo – fora as distrações que enfrentamos dentro de casa, como crianças, barulhos, e isso sempre me dispersa”, conta.

A instituição ofereceu como “auxílio” um chip para acessar a internet. Mas, para isso, os estudantes teriam que abrir mão do desconto e pagar o valor “cheio” da mensalidade.

Loyann reclama dos materiais precários disponibilizados pela faculdade e as constantes trocas de aulas por palestras sem aviso prévio.

“Cada dia é uma surpresa”, diz. A mais recente foi a demissão em massa de mais de 300 professores no início desta semana. Segundo Loyann, docentes que se esforçaram para se adaptar e disseminar conhecimentos complexos por meio do vídeo foram substituídos por palestras sem ligação com o curso.

“Fica mais uma vez o descaso com os professores e com os alunos, que estamos tentando sobreviver em tempos de pandemia pagando aulas que não temos. Apenas nosso dinheiro importa”.

A turma inteira quer trancar o curso

Giovanna Lopes (foto: arquivo pessoal)

“Os professores são sensacionais”, diz Giovanna Lopes, de 19 anos. Ela está terminando o primeiro semestre de Publicidade e Propaganda na Uninove. Antes, chegou a cursar Direito na mesma instituição, mas trancou. “Nos 2 cursos, aprendi muito. O X da questão é a falta de cumprimento da secretaria em conjunto da coordenação”.

No começo, ela gostou de ter as aulas à distância para não perder conteúdo. “Mas nada são flores: continuamos pagando o valor de uma aula presencial”. A nova “bomba” que caiu esta semana gerou um “misto de nervoso e tristeza” na jovem moradora do Parque Residencial Cocaia (Extremo Sul de São Paulo).

“A sala inteira do meu curso está preferindo trancar do que pagar um valor absurdo – e tem razão. A maiorias das pessoas está sem emprego e prefere deixar de estudar para conseguir trazer algo para casa. E eu não discordo delas”.

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