Nesta terça-feira (19 de julho), arte-educadores em greve nas cinco Fábricas de Cultura mantidas pelo Governo do Estado de São Paulo em diferentes quebradas da capital – Capão Redondo, Jardim São Luís, Brasilândia, Vila Nova Cachoeirinha e Jaçanã – lançaram uma moção de repúdio para coletar assinaturas contra as ações da organização social (OS) Poiesis.
No texto, os educadores repudiam as violências e abusos praticados pela Poiesis contra eles e os aprendizes das unidades administradas pela organização, que estão em luta contra o sucateamento das Fábricas de Cultura.
Até a publicação desta matéria, mais de 600 assinaturas de artistas, ativistas, educadores, coletivos, movimentos e da população em geral já tinham sido coletadas. A carta deve ser entregue à Secretaria de Cultura do Estado na semana que vem. Para assinar, clique aqui.
Por meio de um convênio, o governo de Geraldo Alckmin repassa dinheiro público para a organização social (OS) Poiesis executar formação cultural em música, teatro, dança, circo, literatura, multimeios, entre outras áreas, para administrar essas cinco unidades. A OS é dirigida pelo tucano Clóvis de Barros Carvalho, um dos fundadores do PSDB e ex-ministro da Casa Civil do governo de Fernando Henrique Cardoso. Outras cinco Fábricas – Cidade Tiradentes, Parque Belém, Itaim Paulista, Sapopemba e Vila Curuçá – são administradas pela OS Catavento Cultural.
No dia 24 de maio, 70 aprendizes da Fábrica de Cultura do Capão Redondo ocuparam a unidade contra os cortes dos recursos e a precarização do equipamento. Releia aqui uma reportagem que publicamos sobre o dia a dia na Fábrica ocupada. Ao longo de um mês, outras ocupações de curta duração também aconteceram no São Luís e na Brasilândia, onde 22 jovens foram detidos em reintegração de posse pela Polícia Militar.
No Capão, após 51 dias de ocupação, a Polícia Militar cumpriu reintegração de posse determinada pela Justiça no último sábado (16) e prendeu dezenas de aprendizes. No mesmo dia, jovens ocuparam a Casa das Rosas, equipamento cultural administrado pela Poiesis na avenida Paulista.
Em outra frente, há quase um mês mais de 100 arte-educadores das cinco unidades administradas pela Poiesis decidiram entrar em greve contra as demissões que acontecem desde o início do ano, além da redução de horas nos ateliês e em sua própria carga horária, a equiparação salarial, a reintegração de funcionários demitidos e a retratação pública da Poeisis perante os aprendizes em luta e todas as comunidades atendidas.
Na véspera da greve vigorar, 15 educadores foram mandados embora por telegrama e e-mail. No momento, a greve está suspensa para negociação. O processo se encontra em discussão no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) e a tendência é favorável aos grevistas. A principal reivindicação, agora, é a reintegração dos demitidos.
Leia abaixo, na íntegra, a moção de repúdio à Poiesis
“Nós, abaixo-assinados, vimos por meio dessa, demonstrar publicamente nosso repúdio às sucessivas violências e abusos da Organização Social POIESIS para com aprendizes, arte-educadores e comunidades atendidas das Fábricas de Cultura do Governo de Estado de São Paulo (Jaçanã, Brasilândia, Jardim São Luiz, Vila Nova Cachoeirinha e Capão Redondo).
Há cerca de um mês, a POIESIS deu início a um plano de sucateamento do projeto pedagógico, com perseguições políticas, redução de horário de ateliês e bibliotecas, sobrecarga de funcionários e demissões em massa (15 arte-educadores foram demitidos por telegrama, depois de deflagrada a greve).
Com a desculpa da “crise econômica”, a Coordenação do projeto demitiu os arte-educadores que questionavam a estrutura e exigiam explicações e transparência acerca do uso e gestão do dinheiro público direcionado à OS.
Em movimento autônomo, os aprendizes das diversas unidades começaram a se mobilizar. Tal mobilização resultou em três ocupações: a da Fábrica de Cultura do Capão Redondo, que (re)existiu por 51 dias, a da Fábrica de Cultura da Brasilândia, que foi reintegrada um dia depois de ocupada, e a da Casa das Rosas (Oficina Cultural também gerida pela OS POIESIS).
Nos três casos, a POESIS não se dignificou a conversar ou abrir um diálogo franco com os aprendizes. Recorrendo ao braço armado do Estado, as reintegrações foram executadas com a opressiva ação da Polícia Militar. Braços armados, balas de borracha, viaturas e cacetetes estamparam um cenário de abuso e violação de todo e qualquer direito humano. O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) foi diversas vezes autoritariamente violado nesse processo. Crianças e jovens (entre 12 e 21 anos) foram levados para delegacias, passaram mais de 30 horas encarceradas, sem que a Instituição ao menos notificasse os responsáveis. Ocupações foram invadidas e reintegradas sem que ao menos houvesse uma liminar judicial para tal. Ameaças e assédios policiais se tornaram frequentes, mesmo quando os interlocutores tinham 14 anos. Foram exemplos claros de violação dos direitos humanos, violência policial, abuso de poder, e principalmente, da completa incapacidade da POIESIS em gerir esse projeto cultural, que é feito com verba pública e deveria ser voltado para emancipação e autonomia por meio da arte.
Sendo assim, repudiamos a ação da POESIS em conjunto com a Polícia Militar, as desocupações violentas e as prisões de jovens e crianças, o descaso para/com as comunidades periféricas atendidas, o abuso de poder e perseguição política em relação aos arte-educadores em greve e ao aprendizes em luta.
Não tem arrego!”