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foi ativado muito cedo. Isso geralmente é um indicador de que algum código no plugin ou tema está sendo executado muito cedo. As traduções devem ser carregadas na ação init
ou mais tarde. Leia como Depurar o WordPress para mais informações. (Esta mensagem foi adicionada na versão 6.7.0.) in /home/periferiaemmovimento/www/teste/wp-includes/functions.php on line 6114Por Aline Rodrigues
“Nós nascemos com a identidade de gênero masculino ou feminino, mas essa identidade está do pescoço para cima, porque ninguém pensa com o braço, com o pênis ou com a vagina”, alerta Brunna Valin, que como transexual teve grande parte dos acontecimentos de sua vida guiados pela aprovação ou rejeição da sociedade de sua identidade de gênero.
Hoje, com 39 anos, ela conquistou seu espaço na sociedade e se sente parte dela. Representa o Fórum Paulista de Travestis e Transexuais, é militante pelas causas de pessoas HIV+ e do público LGBT. É orientadora socioeducativa no Centro de Referência e Defesa da Diversidade, mas sua luta foi grande até assumir esses papéis e sair da margem da sociedade.
A exclusão começa em casa
Desde cedo, Brunna se sentiu pressionada a se adequar aos padrões do que é ser um homem. Diante disso, ela tinha uma escolha a fazer. Poderia atender a pressão que vinha de todos os lados, da família, do ambiente escolar e se adaptar ao que os outros esperavam dela ou lutar por sua essência que sempre se sentiu mulher. Ela escolheu uma vida que fizesse sentido, mas sofreu por isso.
Ainda pequena, em Pedranópolis, interior de São Paulo, ela apanhava em casa por ser diferente de seus irmãos. O pai dizia que ela tinha que “se endireitar” e em muitas situações privilegiava os irmãos. Como toda sua família trabalhava na roça “eu via meu pai recebendo o pagamento do dono da terra e meus irmãos sempre com dinheiro, mas eu não ganhava nada do meu pai”.
De acordo com ela, até sua beleza feminina a prejudicou. “Quando se chama muito a atenção pela beleza e está à margem pode sofrer muito mais abuso. Eu mesma, com 11 anos, tive meu direito sexual violado e por uma pessoa que frequentava minha casa”. E até nesse caso Brunna foi considerada errada e punida. Apanhou e a mandaram morar com a avó, enquanto o homem que era filho de vereador e amigo da família, continuou visitando a casa de seus pais.
Depois disso, foi para São José do Rio Preto. Horas na casa de um tio, depois de outro parente. Quando cansou de não ser aceita resolveu se virar sozinha. Foi para a rua e se tornou profissional do sexo. Diz ter aprendido muito com as cafetinas, pessoas que a acolheram. Foi a primeira vez que foi remunerada por um trabalho.
Aos 17 anos ela reconquista o direito de uma moradia fixa, já com um companheiro. Com esse relacionamento ela se fortaleceu e começou a “sair da exclusão social”, como ela mesma diz. Mas também foi nessa época que ela descobriu ter HIV/Aids e depois de seis anos de relacionamento seu parceiro, também com aids, falece por insuficiência respiratória . Como ela hoje brinca, “eu fui a primeira viúva da aids do interior”.
Depois de se afastar das ruas por um tempo, ao perder o marido e a referência de família, volta a trabalhar com outras cafetinas.
“Eu fiquei em São José do Rio Preto por 22 anos sendo profissional do sexo”, conta Brunna. Mas teve momentos diferentes nesse cenário. Em um relacionamento posterior que durou oito anos ela fazia programa “só quando precisava”. É quando ela começa a fazer vários cursos no Sesi, no Senac e perceber seu papel social como cidadã e como transexual. Entende o exemplo que ela poderia ser para outras pessoas, o conhecimento que tem para compartilhar e que pode lutar por seus direitos.
Mudança de papel
Ao descobrir mais valores em si, quis deixar o trabalho nas ruas. “Não queria ser mais a margem”, reforça ela. Para isso, saiu da região central da cidade e passou a viver na periferia. Lá encontra o que não tinha no centro. “As pessoas não me olhavam com olhar de sexo, tinha outra troca. Mas, eu não consigo emprego e não quero mais ser prostituta. Então eu acabo exercendo outros papéis”.
Ela monta uma casa e se torna cafetina para outras meninas. Prefere chamar o lugar de “casa de acolhimento”, porque de fato acolheu as mais de 100 “filhas”, como gosta de chamar. Apesar da função principal que assumia, ela incentivava todas a estudar para saírem daquela vida, pois sabia bem das dificuldades.
“O que eu não fui mãe na vida eu fui ‘mãe’ para essas pessoas. Eu percebia a minha contribuição. Muitas voltaram a estudar, casaram, mudaram de trabalho. Isso foi muito importante para eu entender a demanda delas, porque na minha época as pessoas não me ouviam”.
Mesmo percebendo sua influencia positiva para as meninas, Brunna se questiona se o que faz ainda é errado. É quando resolve deixar tudo e morar na cidade de São Paulo.
Um encontro definitivo com sua identidade
Na metrópole, onde vive até hoje, Brunna encontrou sua melhor forma de atuar e contribuir com suas causas, de conscientização sobre o HIV/aids e a luta pelo respeito e direitos do público LGBT, principalmente de travestis e transexuais.
Perguntada por muitos se é ruim ou é bom ser HIV+ em sua luta ela responde que é bom. “Para o meu movimento é bom, porque eu estou dizendo que eu estou viva e lutando com HIV/Aids e posso passar essa mensagem para o outro que ele não vai morrer, mas que precisa se cuidar”.
Da mesma forma, por ser transexual, em seu trabalho no Centro de Referência e Defesa da Diversidade se torna referência para as pessoas que chegam ao local. “Eu consegui conquistar muitas coisas na minha vida baseada em uma boa auto estima e é o que eu trago para os usuários do Centro de Referência. Se no mínimo eu e a equipe técnica conseguimos promover a auto estima de alguém, nós já fazemos um papel muito importante”.
Também em São Paulo, a orientadora socioeducativa sentiu a diferença de morar na região central da cidade e, há pouco tempo, ao se mudar para uma periferia da zona leste. “Na periferia de São Paulo eu percebo de novo um acolhimento maior. No meu bairro eu não ouço nenhum xingamento de ‘ô viado’, ‘ô traveco’. No centro ainda sim”. Ela já teve diversas provas desse respeito. “Um dia eu estava chegando em casa às 11 horas da noite e em um bar colado de casa tinha um cara já meio alterado que quando me viu fez uma piada. Os outros falaram para ele ‘aqui nesse lugar todo mundo se respeita, se você não respeita as pessoas, não volta mais aqui’”.
Brunna se orgulha de sua luta e por hoje ser respeitada por quem ela é. Acorda muito cedo para trabalhar como muitos vizinhos. Faz questão de contar com carinho do bom relacionamento que tem com o marido. Com ele, divide os afazeres domésticos e uma rotina comum de qualquer casal. Inclusive, por vontade do companheiro os dois usam uma aliança de prata, conhecida como ‘aliança de compromisso’, mas que pretendem em breve trocar por uma de ouro.